Mas antes é preciso esclarecer o conceito de criança interior e criança ferida. O espaço interno da criança interior que nos habita, e que é saudável, se refere a nossa espontaneidade, graça, vivacidade, criatividade, confiança e alegria. A criança ferida é simplesmente uma metáfora para falarmos do espaço vulnerável que faz parte do nosso ser, e que também se refere ao estado emocional e mental da criança interior.
Nascemos como uma tela mental e emocional em branco. Ao longo dos anos, absorvemos, primeiramente, os valores, as crenças e a forma de amar de nossos pais ou das pessoas que nos cuidaram. Com o passar dos anos, acumulamos também a experiência com a escola, professores e autoridades, além de vivenciarmos a religiosidade dos nossos cuidadores, da cultura e sociedade que estamos inseridos, ficando tudo isso arraigado no nosso ser. Ou seja, vamos, enquanto criança, nos moldando com os hábitos e comportamentos dos adultos que fizeram parte de nossas vidas.
As feridas, choques e traumas que vivenciamos, enquanto criança, ficam registrados no nosso sistema nervoso e nas nossas células, gerando as couraças musculares que tanto Wiliam Reich nos ensinou. E essas experiências voltam à memória sempre que algo externo as desperta, como um gatilho, as situações da vida adulta nos remete para o espaço interno da criança ferida.
É importante lembrar que o espaço da criança ferida se refere a nossa inconsciência. Nesse estado mental não temos a capacidade de amar e de esperar, não conseguimos estar no presente e assimilar experiência, não podemos adiar gratificação e o prazer, e por fim não encontramos espaço interno para sentir dor e desconforto.
Os comportamentos da criança ferida são: reação e controle, expectativas e direitos, concessões, dependência e o pensamento mágico. Os sentimentos são: medo e choque, vergonha e insegurança, carência e vazio, mágoa, desconfiança e raiva.
Todos nós nascemos com necessidades básicas que precisam ser supridas por nossos cuidadores que são as de sobrevivência, ou seja, casa e comida, e a necessidade de ser amado. Todos os pais deveriam ter como premissa básica suprir as necessidades do seu filho dando-lhe segurança e afeto.
Os pais tentam, a partir da sua consciência, educar seus filhos da melhor maneira possível ou da maneira que eles dão conta. Essa educação, portanto, pode variar do zero absoluto – gerando muitos traumas, feridas e não aceitação – até a melhor tentativa de educar com mais consciência, reflexão, limites e dialogo. Vale lembrar sempre que, de qualquer forma, não somos perfeitos.
Sendo assim, os adultos passam seus traumas, medos, inseguranças para os pequeninos, encaixotando e moldando a energia vital das crianças através de suas crenças e valores tão enraizados, pois também não sabem lidar com sua vitalidade natural. Como os pequeninos são totalmente dependentes dos adultos, as crianças submetem sua verdade em prol dos cuidados e afetos de seus cuidadores. Como poderia a criança lutar ou fugir, como os animais, se são tão dependentes? E é ai que a porca torce o rabo e começa toda a neurose humana.
Nos camuflamos para sermos amados e aceitos, desenvolvemos nossas personas para vivermos nesse mundo social e das imagens e, na vida adulta, não sabemos mais quem somos, o que de fato gostamos, o que sentimos, quais são nossas necessidades básicas, o que nos faz feliz e o que nos traz serenidade e paz.
Aí, já crescidos, vamos em busca do amor, na maioria esmagadora das vezes, na tentativa equivocada de encontrarmos no outro a experiência de sermos amados incondicionalmente. Buscamos alguém que cuide de nós, que supra todas nossas necessidades básicas e que acabe com a sensação profunda de vazio que carregamos internamente. Sinceramente você acha que o outro está aqui nesse planeta para suprir essas necessidades? Se você disse sim, posso lhe dizer com muitas chances de acerto que você vai se machucar e sofrer.
Como não tivemos a nutrição necessária na vida infanto-juvenil, vamos com uma esperança gigante que o outro, que não é papai nem mamãe perfeitos, nos nutra daquilo que nos faltou, e é aí que a confusão se instala nos relacionamentos amorosos.
“Projetamos e despejamos no outro todas nossas carências, medos e um desejo enorme que nos tire de nossos desconfortos e que nos leve para o paraíso onde só exista prazer e deleite.”
Por isso que muitas vezes começamos nossas relações carregando uma cumbuca de pedinte: por favor me dê amor e afeto, eu preciso, me sinto tão só, etc. Pense se ir assim para uma relação tem chances de ser um encontro consciente e com boas perspectivas de troca? É praticamente impossível… São duas crianças feridas se relacionando, alternando o papel de cuidador e de criança. E geralmente, no caso do cuidador, usando todos os jogos de poder para manter o outro ali. A partir desse espaço o que de fato podemos ter é muita dor, sofrimento e incompreensão.
Para nos relacionarmos com o outro de forma saudável, precisamos primeiramente nos conhecer. Para tanto, podemos fazer as seguintes perguntas: quais são minhas fragilidades e vulnerabilidades? Quais são minhas habilidades e força? Devemos aprender a nos nutrir, colocar nossa criança ferida no colo e cuidar dela enquanto adulto hoje, e não despejarmos tudo isso no colo do outro. Quem quer assumir a responsabilidade de suprir as necessidades da criança ferida do parceiro? Poxa vida, você já tem a sua para carregar. O que podemos fazer é sermos sinceros com nós mesmos, buscar nos conhecer e, a partir daí, passamos a ter possibilidade de nos relacionar com mais dignidade e no espaço do compartilhar e da comunicação não violenta.
É fato que nossa natureza humana é amor, e que nascemos com a possibilidade de vivenciar o amor, porém não nascemos sabendo amar. Precisamos aprender. E vamos nutrir desde já o nosso espaço interno de vitalidade, criatividade e espontaneidade da nossa criança interior saudável.
Viva a criança interna e todas as crianças do planeta!
Até o mês que vem.
Nartan Lemos é psicóloga com especialização em Terapia de Relacionamento, Psicoterapia Corporal, Bioenergética/Biossíntese, Dançaterapia e Meditação. Atende individual e casal em Brasília.
* Artigo escrito para a edição Outubro 2012 do Jornal Lotus – Bem estarRelated: conciertos cristianos 2022 usa, swede savage crash photos, world of warships aim assist mod 2022, portage county fire department, unexpected parameter: since tweepy, how to play pixelmon with friends 2022, why is nick not part of ghost adventures, functionalist perspective on human trafficking, what did krishna told arjuna in bhagavad gita, cdr shop recast, rod starmer, landlord causing emotional distress ontario, city of buffalo employee salaries, jeff kessler missing, what happened to catfish on cajun justice,