A criança interior emocional ou criança ferida é uma metáfora para falarmos de um espaço de vulnerabilidade que inclui os nossos sentimentos e a nossa história de vida
Todo o ser humano nasce com o núcleo vital protegido. Vivendo nesse espaço, que também podemos chamar de self ou essência, a criança se sente curiosa, espontânea, viva e amável. Ela começa a se relacionar com ela mesma e com o mundo com confiança e alegria.
Contudo, ao crescer e ir para o mundo, a criança encontra com o espaço da vulnerabilidade, que é vivenciado por meio dos traumas ou situações traumáticas.
Vivendo no espaço do núcleo vital, a criança se sente conectada com todos e com a existência. Ao vivenciar o trauma, vivencia o sentimento de separação. Então, é como se passasse da expansão e alegria para um espaço de contração.
O trauma é uma vivência relacionada a situações pequenas ou acontecimentos grandes e profundos. Por exemplo, quando há algum tipo de negligência, invasão, abandono – até mesmo a perda ou morte do pai ou da mãe. É quando a criança conhece pela primeira vez os sentimentos de medo a desconfiança.
Em sua consciência, a criança entende que quem deveria a amar, cuidar e proteger, a invade, abandona; comete abusos verbais e físicos que contraem sua energia. Dessa maneira, ela conhece a camada da vulnerabilidade, onde estão os medos, a vergonha, a insegurança e a desconfiança – e a energia vital está mais recolhida. Assim surge o estado de consciência da nossa criança emocional.
Quando uma criança sente dor e medo, o que ela faz para se proteger? Dizemos que ela cria uma camada de proteção e defesa, pois ela não quer mais ser ferida. Ao passo que crescemos e nos desconectamos do nosso núcleo vital (da nossa vivacidade, espontaneidade e confiança na vida), criamos nossas defesas e armaduras energéticas – o que Reich chamou de couraças musculares e Lowen com a Bioenergética identificou as estruturas de caráter e desenvolveu a leitura corporal caracterológica.
Notamos que esta persona cheia de armaduras, afastada do núcleo vital, não tem capacidade de entrar em contato com os sentimentos. No estado de consciência da criança ferida, entrar em contato com os sentimentos pode significar a morte – por isso ela se defende e se protege.
Com os traumas e acessos à camada da vulnerabilidade, passamos da energia da expansão para a contração. É como se a nossa chama divina fosse diminuindo até ficar pequenininha. Adultos, vivemos como se estivéssemos cristalizados nessa camada de proteção e defesa.
Precisamos entender que defesa e proteção se transformam em comportamento. Presos à nossa criança emocional, queremos manipular as pessoas e as situações, ou nos isolar. Podemos também ficar muito bonzinhos, bajulando os outros e tentando agradar. Em geral, nos comportamos assim para não entrar em contato com a nossa vulnerabilidade. Dessa forma, nos afastamos ainda mais da nossa essência.
Identificados com esse estado mental infantil, presos em nossa criança ferida, acabamos tendo uma vida automática, sem conexão ou presença. Não temos a capacidade de estar aqui e agora, e suportar o desconforto. Queremos amar e ser amados, entretanto, com tantas camadas de proteção e defesa, acabamos afastando as pessoas e vivendo em um estado de inconsciência.
Na Terapia da criança interior ferida, entramos em contato com a nossa criança emocional, criando mais espaço para suportar a dor e o desconforto. Também atravessamos a nossa camada da defesa e proteção, elaboramos os nossos sentimentos.
Propomos acolher a história da nossa criança ferida, ter amor e compreensão por nossa parte vulnerável, para que possamos retomar o contato com a nossa essência. Adultos, isso significa ter consciência e clareza. Vivendo no estado mental da criança emocional, fazemos muito drama e confusão. Já no espaço do self adulto, vivenciamos a clareza.
Como saber que estamos vivendo no espaço do self adulto e da clareza? Por exemplo, é quando estamos em contato a natureza, com as crianças, vivendo no presente. É quando estamos em com nosso corpo (dançando, praticando algum esporte). É quando sentimos a natureza viva que há em nós. Mas para chegarmos ao mar, precisamos atravessar a floresta. No entanto, evitamos o desconhecido. Vivendo no estado de consciência da criança ferida, achamos que vamos sofrer demais ou que não vamos dar conta de sentir o medo e o desconforto. Mas isso não é real, é uma fantasia que construímos ao longo da vida.
Quando nos permitimos fazer mergulho interior – por meio de um trabalho terapêutico feito de forma suave e profunda, cada um no seu tempo e ritmo – vemos que é possível em contato com a nossa delicadeza, que também nos traz para um espaço de humanidade e compaixão.
Assim, na proposta terapêutica do Learning Love vamos conhecer e acolher a nossa criança ferida. Passo a passo, já adultos (e com clareza), é como se déssemos a mão à nossa criança emocional e a levássemos para a luz. Este é o convite.
“A ruptura da identificação com a criança emocional é um processo que exige tempo, paciência e perseverança. Mas isso ajuda a ter certeza de que não precisamos dela. O amor não se baseia em necessidade, e sim em consciência. Consciente, posso afastar-me da criança interior carente e reconhecer que ela é só uma parte da mente criada pelos condicionamentos negativos. Isso não significa que eu tenha que negá-la, e sim reconhecer que suas bases estão no passado. Não tem nenhuma realidade presente.” O amor não é um jogo de criança (Krishnananda)